13 de janeiro de 2013

Letter XXXV

O que nos define verdadeiramente ?

Somos feitos de uma infinidade de órgãos e membros. Somos feitos de pó, de osso. Somos carne coberta de tecido, ou mais ? Onde está a magia ? Hoje lembrei-me de algo que se passou comigo numa outra vida, há milhares de anos. Hoje lembrei-me de ti.
Tenho ideia de que na primeira vez que te vi, tu brilhavas. Estava escuro e o mundo eram sombras, projetos largados por falta de vontade, sonhos quebrados caídos nas escadas, pedaços de tempo que o próprio tempo arrastava pela rua. Sentia-me sugado por aquela sofreguidão de prioridades. Dinheiro. Dinheiro. Trabalho. Dinheiro. Sentia-me traído por aquela humanidade que se esqueceu daquilo que tem de melhor. Companhia. Humanidade que vivia na procura de um carro melhor, uma casa melhor, uma mala melhor. Para poder ter esses objetos abdicavam de tempo com a família, abdicavam de tempo. Pessoas que abdicavam do mundo e dos seus, usavam malas impecáveis. Lembro-me que usavas apenas um vestido branco, que os teus cabelos eram claros como as minhas ideias, e os teus olhos desse tom salgado que roubou o mar. Lembro-me que não disseste nada mas eu ouvi-te com uma atenção que me queimou a cara e o corpo. Como se a tua mão ficasse marcada em mim. Não me lembro se estavas feliz. Apercebo-me agora que só me comecei a preocupar com isso algum tempo depois. Porque eu era um indio. Habituado a ferro e fogo, habituado a correr, a fugir, escondido do mundo e do sol. Lembro-me que os meus joelhos ainda tinham as marcas do chão, e que os meus olhos não aguentavam permanecer totalmente abertos, por não estarem habituados a tanta luz. Eu conheci outras antes de ti. Não como tu, porque não sei o que tu és. Eram diferentes, não brilhavam, sorriam, mas não queimava, como se aquele sorriso não fosse meu. E eu também sorria, mas por dentro o mundo rodava e eu não o acompanhava. Eu não estava ali. Estava sentado, a um canto, demasiado arrogante para me misturar. Demasiado assustado para fugir. Lembro-me que os teus pés mal tocavam no chão, mas o teu corpo combatia a gravidade da Terra com uma intensidade que eu fui desviado de tudo. E os planetas alinharam-se para te ver sorrir. E tu sorriste. E iluminaste a Terra inteira. Lembro-me de desejar do fundo do meu coração que pudesses ser minha. Mesmo que só por um dia. Como se eu te pudesse merecer.


O que nos define verdadeiramente ?

Somos feitos de uma infinidade de órgãos e membros. Somos feitos de pó, de osso. Somos carne coberta de tecido, ou mais ? Onde está a magia ? Hoje lembrei-me de algo que se passou comigo numa outra vida, há milhares de anos. Hoje lembrei-me de ti. Tinhas apenas um vestido branco e os teus olhos viram o que não foi desenhado. Como se tu já soubesses o que poderias desenhar. Quando mais duvidei da resistência da magia neste mundo de valores. Valores, não valores. Das casas e dos carros, não os sérios. Foi a primeira vez que vi uma fada. E então voltei a acreditar.



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