31 de março de 2013

Letter XLVI

Sabes do que sinto falta ? Dos pés na areia. Sinto falta do sol me queimar a pele e secar os lábios. Sinto falta da sede, da roupa larga e o teu cabelo comprido. Há duas coisas certas na vida. A morte, e o Verão. Porque chegam inevitavelmente. O sol pode fazer-se esperar mas quando aparecer vai empurrar-nos a todos para a areia, escurecer-nos os corpos e aquecer-nos o sangue. Sinto falta do mar. A vida ensinou-me que se o mar nos beija a pele, provavelmente não temos, nem teremos brevemente, nada que fazer. E isso é bom. Esse nada que fazer. Desperta-nos as ideias e faz-nos pensar que nada sabe a pouco, e que pouco é finito. Gostava que quiséssemos muito, que não chegasse pouco. Mas chega. Por hábito ou herança, por medo ou preguiça deitámo-nos no pouco. E ali ficámos, a fazer nada. Nada sabe a pouco. Pouco não me sabe a ti. Mas que sei eu ? Sei a que sabes. Aprendi de pequeno. Sabes-me ao frio lá fora e ao quente no chocolate. Sabes à saudade que me sufoca neste livro que parece pequeno se não estás. Tu, minha história, que me adormeceste noite após noite, quando o escuro me zumbia nos ouvidos e me assustava o espírito. Tu que me fizeste arranhar o chão nesta busca de ti, do teu bem estar. Um bem estar que se senta e vê crescer os netos, numa euforia louca que lhe fugiu das pernas mas acende a alma. A minha alma és tu. E não te vendo. Porque sei o quanto me custaste, porque sei que vales mais do que posso, tenho, ou sou. Porque tu és tu. Sabes do que sinto falta ? Da chuva lá fora e nós cá dentro. Do barulho da rua nos carros que passam e nos gritam que vivamos. As janelas cobrem-se da cor que lhes dás, com um pincel que comanda o mundo. Pintas-me de coragem para que possa pintar-te em cada prédio, rua e estrada. Para que te vejam e conheçam. 
Sabes do que sinto falta ? Do sabor do ar nos segundos que precedem a tua chegada. Como se a brisa se tornasse palpável e cada respiração uma nota musical. Sinto a tua falta, todos os dias. E todos os dias me acalmas o corpo e apagas a mente. Como se pudesse pensar contigo. Como se pudesse pensar se não em ti. Espera o Verão comigo. Sei que estaremos juntos no resto.

Sabes do que sinto falta ? Dos pés na areia. Sinto falta do sol me queimar a pele e secar os lábios. Sinto falta da sede, da roupa larga e o teu cabelo comprido. Há duas coisas certas na vida. O verão, e tu. Porque chegam inevitavelmente.

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